sexta-feira, 25 de junho de 2010

Minha vida de Barbie

É muita coragem admitir minha ignorância ao achar que a Barbie realmente tinha 120 profissões. Aos cinco anos de idade a gente leva tudo ao pé da letra! Não tenho culpa, ninguém me explicou que a boneca foi feita em várias versões – e não que a Barbie como pessoa tinha inúmeros talentos e conhecimentos. Eu achava que ela tinha sido feita à imagem e semelhança de alguém real, que podia ser desde uma astronauta até uma sereia.

O mundo da Barbie era fantástico. Qual menina não sonhava em morar naquela enorme casa toda cor-de-rosa, ter um namorado lindo como o Ken e os cabelos sempre brilhantes? Nas brincadeiras (minha e das minhas amigas, pelo menos) a gente sempre se casava aos 18 anos e era rica, famosa e tinha inúmeras aptidões. Sabíamos cozinhar, tínhamos roupas lindas e, mesmo que já tivéssemos uma certa idade, não precisávamos de cirurgia plástica.

A Barbie tinha carros conversíveis, cavalos lilás, vestidos esvoaçantes (que mais tarde foram inconscientemente uma inspiração para as festas de 15 anos). Ela era o reflexo de uma sociedade que mudava aos poucos. Um novo mundo que queria ver suas crianças com realidades diferentes das suas mães, que começavam a sair de casa para trabalhar, mas que fossem ainda mais consumistas, fashionistas, vaidosas e sensuais.

A Barbie era a projeção da mulher contemporânea perfeita, com carreira, beleza, sucesso, dinheiro... Apesar de todo o machismo por trás deste ideal, ela fazia seu papel de dominadora tendo um “homem” ao seu lado que parecia mais um objeto, um amante, um go-go boy, um gigolô.

A Barbie também participava dos nossos sonhos mais impossíveis. Ela poderia ser princesa, havaiana, bailarina, tudo tão romântico e sedutor, como a visão que se idealiza das mulheres. Tudo isso sem esquecer da cintura fina, os cabelos loiros, a pele branca, a maquiagem e o salto alto. Suas amigas eram tão fantásticas como ela, mas não superiores. O importante mesmo era ser a Barbie! Ela sempre fazia o bem, sabia cantar, dançar, desfilar, ser miss e zelar pela paz mundial. Era um exemplo! Se não fosse uma boneca, mereceria um prêmio Nobel.

Muitos anos e suspiros depois quebrei a cara quando descobri que não me casaria aos 18 anos nem se fosse com o príncipe William. Mas essa injeção de realidade aconteceu suavemente. Primeiro, não ganhei um carro quando sai da escola. As roupas justas e decotadas não se adequavam ao meu corpo de menina fora dos padrões e mulher em ascensão.

Depois, um trabalho tão comum como o de garçonete, vendedora ou cabeleireira não me traria independência financeira: eu ainda moraria com meus pais por muitos anos. O Ken era um mito. Todas as qualidades criadas para ele eram uma ilusão de menina. Na vida real não era tão simples ter um namorado, um vestido cor-de-rosa ou um diploma universitário. Para ser veterinária era preciso muito mais do que uma embalagem da Estrela com o consultório prontinho lá dentro.

A Barbie não tinha passado pela primeira paixão, o primeiro beijo, a primeira vez e já vinha com vestido de noiva, véu e grinalda. Ela não passou pelas fazes em que a gente chora por um amor platônico, faz testes de revista e fica com vergonha de colocar biquíni na viagem com a turma da escola.

Hoje, no auge dos meus 20 e pouquinhos anos, poucas mechas loiras, marcas de espinhas, alguns Kens, uma profissão, uma dúzia de trabalhos e o carro emprestado da minha mãe, sei que não precisaria dessa vida de Barbie para mim.

A boneca perfeita estava sempre com um sorriso de angústia, fingindo uma felicidade de plástico, vendendo um estilo de vida inútil e impossível. Algo tão traumatizante quanto descobrir que as bonecas não vinham junto com a mesa de jantar, como mostrava na caixa do brinquedo. Ou ainda tão constrangedor quanto ganhar um exemplar do Paraguai no Natal.

E tem mais: a Barbie nem sequer teve infância! Ela foi definitivamente infeliz, coitada.

2 comentários:

  1. "Para ser veterinária era preciso muito mais do que uma embalagem da Estrela com o consultório prontinho lá dentro."
    Frase perfeita para mim...

    Val.

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  2. amei amiga!
    acho que nossa geração passou por essa sindrome Barbie.. e agora estamos descobrindo que a vida não é cor de rosa (e que é até melhor assim)

    Parabéns pelo blog Mari.. ta ficando DEZ! hahahahaha


    amoooo

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